Esta manhã um texto bem conhecido me deixou cismado: “Mas longe esteja de mim gloriar-me, a não ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para mim e eu para o mundo” (Gal. 6:14). Foi remoendo essas palavras que fiz meu caminho matinal até o metrô. Eu tentava entender porque alguém diz que se gloria, que se ufana, num instrumento bárbaro de tortura. Ok, não é uma cruz qualquer, é a cruz aonde Jesus foi pregado, mas ainda assim por que razão a tortura específica de um inocente seria a fonte de glória?
O apóstolo poderia dizer que tem na cruz o símbolo de sua salvação, da redenção de Cristo em substituí-lo na morte, mas isso é diferente de dizer que se ele se pavoneia de algo, é da cruz. Por que razão a cruz seria uma fonte de glória??
Cheguei ao metrô, entrei o vagão e a muito custo consegui achar um espacinho para abrir o livro que eu levava. Poucos minutos depois eu lia: “Quando olhamos para a cruz, vemos a justiça, o amor, a sabedoria e o poder de Deus. Não é fácil determinar qual desses aspectos é mais brilhantemente revelado, se a justiça de Deus ao julgar o pecado, se o amor de Deus ao levar o castigo em nosso lugar, se a sabedoria de Deus em combinar com perfeição as duas coisas, ou se o poder de Deus em salvar aqueles que crêem” (John Stott, Cristianismo Autêntico, editora Vida, p. 75).
A idéia do famoso teólogo inglês pareceu suprir as lacunas de minhas cismas à perfeição. Afinal, eu posso, sim, me ufanar de haver sido justificado perante os olhos de outras pessoas. Eu posso também me gloriar do fato de ser muito amado; na verdade, as fotos de minha família aqui na minha mesa de trabalho são exatamente isso, o que dizer então da maior de todas expressões de amor feitas por Jesus na cruz em meu favor? Eu também posso me gloriar de haver sido beneficiado com justiça e com amor de forma tão sábia.
Mas de todos os aspectos que Stott vê na cruz, acredito que o poder é que fez Paulo escrever aquele texto. A explicação ele mesmo dá: a cruz o crucificou para o mundo e o mundo para ele. Ou seja, a cruz fez com que o mundo – aqui entendido como todos os apelos por condescendência, concupiscência, leniência, orgulho, auto-satisfação a qualquer custo, ou seja, o exato contrário do que pode ser chamado em melhor grau de amor, justiça e sabedoria! – perdesse completamente seu poder sedutor. O poder da cruz é maior do que o do mundo, porque a cruz anula o mundo. A cruz confere a Paulo o poder de não se sujeitar a tudo o que o mundo representa.
Esse poder está longe, muito longe de ser pequeno. Ele é sobrenatural, raro e de impacto inignorável, primeiramente para quem dele se aproveita, e em segundo lugar para quem rodeia essa pessoa. A cruz é fonte de poder. E, superada minha cisma matinal, vivo meus dias porvir me gloriando na cruz de Cristo, cujo poder sinto pulsar dentro de mim.